sexta-feira, outubro 29, 2004

Filmes a ver (lista actualizada)

- Colateral, de Michael Mann
- Terra da Abundância, de Wim Wenders
- Wimbledon (pronto, não vou ver, mas tinha que ter uma desculpa para ter uma fotografia do Paul Bettany durante o fim de semana)

quinta-feira, outubro 28, 2004

...aquelas toilettes não eram um cenário qualquer substituível como se quisesse, mas uma realidade assente e poética como a do tempo que faz, ou como uma luz especial a uma certa hora.

Marcel Proust, A Prisioneira (Em Busca do Tempo Perdido, vol.V)

...o que signifoca que posso deixar-me finalmente de escrúpulos e voltar alegre e justificadamente a ocupar-me de casacos...

Ainda sobre Before Sunset

É verdade que o que eu queria mesmo era que ele tivesse perdido o avião; mas também não sei se acredito que, mesmo que ele tenha ficado, a história de ambos não se resuma a uma combinação dos fracassos que já experimentaram. (Queria acreditar que não, que não, que não.) Este não acreditar leva-me a outro (Eu não acredito em ti. Já não acredito em ti. Nunca mais.) - eu não acredito são as palavras exactas que uso quando quero quebrar o laço que me prende a ele. Quando deixei de acreditar num futuro possível - e feliz - para nós os dois, talvez alguma coisa se tenha quebrado dentro de mim, talvez tenha sido eu mesma. Talvez seja isso que eu tenha contra os romantismos - aos quais as lágrimas sempre cedem, contra a minha vontade - talvez isso me faça não acreditar em mais nada. (Eu antes tinha um sonho; e agora, o que é que tenho?) Talvez seja isso que me enfureça quando vejo coragem e - sonho - representados assim à minha frente (não esquecer como achei gratuita toda aquela cena de Ernesto a atravessar o rio apesar de tudo, gratuita e insuportavelmente complacente).
Tenho medo de me ter tornado uma pessoa plana e amarga, sem sonhos, crescida demais, incapaz demais, sem rumo.

(ele ligou naquela tarde em que felizmente estava no cinema, o telemóvel desligado, sinto que lhe fujo e nem sei porquê.)

terça-feira, outubro 26, 2004

Mais cinema

Ando a retirar filmes da minha lista a uma velocidade estonteante. Ontem fui ver The Motorcycle Diaries (chamo-lhe propositadamente assim, para não colar o ícone de Ernesto Che Guevara às emoções que o filme desperta). O filme é lindo; apesar de nada me ligar à questão da América Latina, a viagem de descoberta é um tema que me toca profundamente... Assim, tentei abstrair-me do Che, o que só me fez voltar a minha atenção para Rodrigo de la Serna, o actor que constrói um Alberto Granado fabuloso, e que não merece ficar escondido a trás da beleza de Gael García Bernal... nem sempre foi possível, no entanto. A cena do atravessamento do rio a nado chegou a irritar-me pela sua auto-complacência. Está bem, está bem, aquilo aconteceu mesmo. Mas que diabo, sem música de fundo. Ou então serão ainda os reflexos da minha melancolia do filme anterior; tendo descoberto que já não sonho, acho patético ver quem sonha. Talvez seja isso, não sei. Mas a isto voltarei mais tarde.

segunda-feira, outubro 25, 2004

O que eu espero mesmo é que ele tenha perdido o avião...


Before Sunset

(Mais um filme fora da minha lista...)
Portei-me bem (só chorei um bocadinho, e ninguém viu), não sei se por me descobrir mais cínica do que eu mesma julgava. Talvez tenha dado por mim a ser mais cínica; talvez seja uma romântica a fingir de cínica; talvez uma cínica a querer ser romântica. Não sei. Sei que tive saudades de mim mesma; saudades dele também.

sexta-feira, outubro 22, 2004

A vida é um milagre

Ontem resolvi aproveitar a minha recente situação de trabalhadora por conta própria (eufemismo mais ou menos disfarçado para o desemprego) para ir ao cinema à tarde. Com o humor com que estava, melhor enfiar-me uma sala escura e viver outra vida. E do topo da minha lista de filmes a ver saiu A Vida é uma Milagre. Estava lá tudo: excesso, música, dança (que saudades da No Smoking Band!), cocaína ao longo das linhas de comboio, uma mula a tentar o suícídio, guerra e amor. E sonho. Luka e Sabaha rolando na terra, a câmara girando sobre o seu abraço. Lágrimas e risos, a vida é um milagre mesmo.

Mais uma nota sobre Quem tem medo...

O texto é de tal forma que rico que serve múltiplas leituras - descobri-las é um dos prazeres que proporciona - desde o imediatismo do riso (e até as razões para este podem ser desmontadas!) ao choque face à violência - quando esta é explícita. E o título? É apenas a ladainha? Ou há aqui também outras camadas?
Quem tem medo de viver no fio da navalha? Quem tem medo da loucura?

quinta-feira, outubro 21, 2004

E agora, o filme?


Também nunca vi o filme com Richard Burton e Elizabeth Taylor. Agora esperarei algum tempo antes de o procurar; o melhor é deixar aquietar primeiro a sensação de vida que a peça deixou.

Eu não acredito em ti. Já não acredito em ti. Nunca mais.

As minhas expectativas eram altas, depois de ter lido coisas como esta.
Mas mesmo assim não saí defraudada: Quem tem medo de Virginia Woolf é de facto a melhor peça que tive o privilégio de ver nos últimos tempos. Não só pelo texto (que não conhecia e que é, de facto, magnífico, pela crueza com que nos mostra o campo de batalha em que se tornou uma relação, pela inteligência dos diálogos, pela intensidade e pelo dinamismo com que se ucedem as emoções e os registos), mas pela interpretação fabulosa: António Capelo e Glória Férias têm o dom de incorporar as personagens e assim as tornar credíveis ao fim de duas falas. Depois, tudo o resto, da iluminação ao cenário. (E Sandra Salomé, que torna Honey capaz de ombrear com o gigantismo de Martha e George.) O Teatro do Bolhão inicia com esta peça um ciclo de espectáculos com textos de pendor realista, e eu não falharei nenhum. E tudo porque o teatro assim faz acontecer magia sob o nosso olhar.

quarta-feira, outubro 20, 2004

Finalmente: arribei?

Passei hoje de manhã pela faculdade, na minha ânsia de reunir informação e material para a tese. Ou, antes, na minha ânsia de fingir que faço, que é maior do que a primeira e por isso tem prioridade. Mas, ânsias à parte, resolvi passar pelo pavilhão onde dá aulas uma antiga professora, aquela que sempre me apoiou apesar da minha absoluta e evidente inépcia (ou inércia). Sorriu-me quando entrei, falou com alegria do painel da Anuária, perguntou-me se tinha trabalho, e disse-me que lhe falasse depois da tese, para ela me ajudar. E despediu-se com esta frase: Fiquei contente por ver o teu nome lá, pensei: que bom, esta rapariga finalmente arribou.

terça-feira, outubro 19, 2004

Pareceu-lhe que de agora em diante ele não precisava mais ter voz de homem nem procurar agir como homem: ele o era.

Clarice Lispector, A Maçã no Escuro

E se os casacos que compro, se o meu (mais ou menos) súbito interesse pelas roupas que uso, se o meu desejo de me mostrar - mulher - não corresponderem a mim mesma, isto é, ao que realmente sou e tive tantas vezes medo de ser e mostrar, mas antes ao desejo de imitar a ideia que em mim faço do que é ser mulher?
(Na realidade, enquanto escrevo, penso que talvez a distinção não seja assim tão importante. O desejo mantém-se, lânguido apesar da chuva.)

domingo, outubro 17, 2004

Domingo

A manhã meia cinzenta, metade da cidade fechada, Serralves completamente fora do meu alcançe: onde procurar refúgio? Domingos arrastam-se lamentavelmente vazios. Amanhã é dia de imitar novamente a rotina, fingir-me ocupada em mil tarefas, atravessar o passeio de cabeça mais ou menos erguida, conforme a disposição e os olhos que me espreitem. Sorrir-lhe, talvez. Se sorrir não for, claro está, comprometer-me demasiado com o desconhecido. Se sorrir for apenas brincar aos crescidos.

sexta-feira, outubro 15, 2004

O dia animado

Ontem foi um dia animado: passeei no Porto em busca de compras e descobri-as na Retroparadise. Não foram apenas as compras que descobri, porém; nem apenas o vintage, ou o casaco preto a assentar-me como se tivesse sido feito para mim. Foi olhar-me sem tanto receio de parecer demasiado feminina, demasiado coquette, demasiado... não sei bem, talvez sedutora. Assumidamente com o desejo de seduzir.
E é claro que casacos são apenas manifestações visíveis desse desejo. Outra, bem mais impalpável, foi subir e descer as escadas do prédio, passando mais ou menos ostensivamente em frente da loja onde trabalha o vendedor mais giro que eu já vi. (Com resultado zero, diga-se; acabei então por tirar quase toda a roupa do armário e experimentá-la em novas variações, como uma criança com um brinquedo novo.)

quinta-feira, outubro 14, 2004

Ou é para chamar a atenção?
Será mimo?

Vale a pena?

Escrever vale a pena? Porque se escreve?
Porque é que eu escrevo?
Reconhecimento, fama glória?
O que tenho eu para dizer?
Dizer a quem?
Não é melhor deixar-me ficar pelo caderno?