quarta-feira, novembro 15, 2006

M.A.


A luz podia ser como se fosse sempre Junho, se soubessemos editar assim os dias: cheios de pressa e sem tempos mortos (porque passeios solitários em longos corredores e por entre jardins nunca mataram ninguém - com a possível excepção de Rilke), com as músicas todas, iPods e sapatilhas; podíamos continuar de carro por uma estrada fora, sem nunca precisar de conversar; nem sequer era preciso uma história, porque afinal há tão poucas e são se calhar sempre as mesmas, era só mesmo uma luz amarela, como se fosse sempre Junho e cinco e meia da manhã

quarta-feira, novembro 08, 2006

desenvolvimento linear misto

Como nem tudo pode ser piano, também há que chegar ao trabalho: voltaram a mudar o percurso do autocarro. Durante os últimos meses entrava pela porta da frente (ou saía, dependendo do ponto de vista), com o último troço de Fernão Magalhães cheio de árvores. Verifiquei quotidianamente o amadurecimento do verde das árvores, nos últimos dias admirava-lhes os vermelhos; e ia seguindo o desenvolvimento das estações nessas centenas de metros. Regressei agora a Costa Cabral, estreito canal onde tudo acontece desde há séculos: conheço o suficiente da sua lógica para lhe apreciar a justaposição de tipo-morfologias, com o que não me conformo é com o tratamento e intensidade de uso que lhe é dado; com isso e com a falta que daqui em diante me farão as árvores.

terça-feira, novembro 07, 2006



Nem tudo pode ser tango: há também piano em frases surpreendentemente curtas e incisivas. (Será que é o que acontece quando esperamos algo de alguém?) Não fosse ter lido acerca das novas regras que Keith Jarrett se impôs a si mesmo nas apresentações a solo (regras ou liberdades, podemos discutir o assunto) e diria que era eu mesma a projectar-me no discurso, a lê-lo assim, directo e breve, sem demoradas e exaustivas explicações, haiku de sons emaranhados ou absolutamente dançáveis – porque afinal de contas por mais que falemos nunca conseguimos dar-nos a conhecer por completo. Horas e horas para chegarmos a isto: posso não reconhecer Pink Floyd quando os ouço mas pelo menos teremos sempre Keith Jarrett.

domingo, novembro 05, 2006

will I see you tonight


na voz obviamente enferrujada de Tom Waits, tango às quatro da manhã na sala no quarto nas paredes e sussurras-me a música ao ouvido,
so send me off to bed for ever more